NA VELHA BOATE, SÓ QUATRO BRIGAS POR NOITE
02/07/2020 Bar do Museu Clube da Esquina
FONTE: LIVRO DE MARILTON BORGES – MEMÓRIAS DA NOITE – 2001 EDITORA ARMAZÉM DE IDÉIAS
No princípio dos anos 60, uma casa noturna marcou época em Beagá: a Boate Almanara. Ficava no segundo andar de um velho prédio situado à Rua Tupinambás, esquina com Rio de Janeiro. A frequência era composta, basicamente, por dançarinos (as) de salão, coronéis endinheirados do interior, boêmios contumazes, músicos da noite, garçons de folga, jornalistas insones, gigolôs descarados, alguns malandros autênticos e, principalmente, como se falava na época, pelas meninas da vida fácil, termo com o qual, diga-se de passagem, nunca concordei.
Nos diversos segmentos noturnos da cidade, entretanto, a casa era conhecida pela carinhosa alcunha de Puxa-Faca, não se sabe se pela respeitosa crença reinante entre seus frequentadores mais habituais ou se pelas poucas brigas que lá ocorriam – uma média de quatro por noite apenas. Fora as meninas, a grande atração da casa era o seu conjunto musical, composto por um guitarrista zarolho, um pianista idem, um contrabaixista que só de dez em dez compassos conseguia acertar uma nota e um baterista que, em virtude de uma dentada desferida por alguma amante ou marido enciumado, ostentou durante muitos anos a dolorosa marca bem no centro do nariz. Todos, entretanto, muito competentes na execução de música para dançar.
Os cantores e cantoras variavam muito, dependendo do humor do proprietário do estabelecimento: “Seu” Elias, um turco baixinho, quase careca, ranzinza como ele só, ainda que, de certa forma, simpático com os jovens músicos em início de carreira.
Naqueles tempos de pouca grana, principalmente entre os da minha idade, a alternativa ideal para muita diversão a baixo custo era o Puxa-Faca, uma vez que, honra seja feita, os preços da casa eram baixíssimos, mesmo que a procedência das bebidas servidas no local não fosse lá muito confiável. Era lá, enfim, que minha “tchurma” se encontrava no final da noite.
O tipo de música entre a rapaziada que começava, naquele tempo, na profissão, era o jazz, uma moda que, mesmo para os mais veteranos, se pesquisada devidamente, permite ao observador mais atento uma descoberta por dia. Só que, convenhamos, o gênero, pelo seu ritmo quase sempre fora do tempo e “quebrado”, oferece também enormes dificuldades para os que ousarem dança-lo.
Jovem gosta de se exibir e, se for músico, pior ainda. Na presença de outros colegas de profissão, então, é um perigo. O Puxa-Faca era o local ideal para nossos ataques de exibicionismo. Só que começaram a ficar caros para “Seu Elias”, já que era só a gente subir no palco para a pista de dança se esvaziar, como que num passe de mágica.
Numa bela madrugada, logo que subi a escadaria da entrada, fui chamado a gerência da casa. Entrei na sala minúscula e lá dentro já estavam o dono casa e mais uns três ou quatro “jazzeiros”, todos meus amigos. Na mesa, um maço de notas de valor médio, presas por um elástico. O turco esbravejou: – Elias deixa “mininos” frequentar a casa. Elias deixa “mininos” beber quase de graça. Elias “numguenta mais”. Elias “baga dinero”, agora, “bra” nunca mais ouvir “oceis” tocar esta “borgaria” de jazz.
Não aceitamos a grana, é claro, feridos no nosso orgulho profissional. Ainda que ressentidos, continuamos frequentando a casa, mas nunca mais se ouviu falar de jazz na Boate Almanara. Ou no Puxa-Faca, como queiram. E a variada roda de frequentadores pôde, finalmente, dançar em paz
Sou a Valéria da Silva, gostei muito do seu artigo tem
muito conteúdo de valor, parabéns nota 10.
Visite meu site lá tem muito conteúdo, que vai lhe ajudar.
Muito bom…vou relembrar essa bela boite “Almanara” de BH anos 60. Não posso deixar de citar a minha participação nessa boite que ficava na Rua Tupinambás esquina com Rio de Janeiro. Ficava no segundo andar. Ali fazia um belo som, trio Elias Salomé (Piano), Ildeo (Contrabaixo) e Waltinho batera( só usava óculos escuro igual do Ray Charles). Não me recordo quem era a cantora. Com ele (Waltinho batera) aprendi a tocar a bela Bossa Nova, Bolero, Foxtrot, Samba Canção e outros…Quase todas as noites ia pra lá e dava um descanso à ele dando uma canja. Nunca me esqueço desse grande batera quando ficamos chapa, eu muito novo nem 18 anos eu tinha, mas entrava na calada. Depois mais tarde em 1966 fiz parte da banda Os Intrépidos com os músicos; Ezequiel Lima (Contrabaixo), Maneco (Guitarra Solo), Flávio (Guitarra Base), Eu na Batera e por algum tempo Wilsinho Ceguinho no Orgão. Antes 1964/1965 também fiz parte do conjunto de baile Blue Star. O meu professor foi “O GRANDE WALTINHO BATERA”. Nunca presenciei uma briga sequer nessa boite…felizmente.