COISAS QUE ACONTECEM NOS BAILES DA VIDA
02/07/2020 Bar do Museu Clube da Esquina
FONTE: LIVRO DE MARILTON BORGES – MEMÓRIAS DA NOITE -2001 EDITORA ARMAZÉM DE IDÉIAS
Apesar de não ser tão radical quanto o meu amigo e grande contrabaixista Tibério César, que afirma que músico que não dormiu numa estação rodoviária não conhece a profissão, posso afirmar que nosso ofício oferece muito mais sacrifícios do que possa supor qualquer vã filosofia. É inenarrável, entretanto, o sentimento diferente advindo da alegria de tocar um instrumento, sendo que só este pormenor supera, e com grande vantagem, todas as vicissitudes que, certamente, ocorrem ao longo da nossa caminhada.
Na relação de outros dos pequenos prazeres que um músico experimenta, viajar para o interior do estado sempre foi um dos meus preferidos. Afinal de contas, depois de trinta anos de profissão, são raras as cidades de Minas onde ainda eu não tenha feito soar os meus teclados ou mesmo a minha voz, já que, no início da minha longa carreira, eu fu, com perdão da má palavra, um “crooner”. Foi desempenhando esta função que ocorreu o fato que passo a narrar abaixo, apenas me reservando o direito de, por absoluta questão de respeito, contar o milagre mas omitir o nome do santo.
A banda da qual eu participava havia tocado num elegante e animado baile numa bela e progressista cidade de porte médio do nosso interior. Como sempre ocorria naquelas ocasiões, não havia músico de conjunto da Capital que ficasse sem conquistar uma namorada naquela cidade, para despeito e ira dos rapazes do lugar. Conosco não foi diferente e, após o trabalho, ainda tivemos tempo para estar com as meninas, quase todas filhas de figuras de projeção da sociedade local, e de roubar alguns beijinhos, que era o máximo que se permitia naquele tempo, principalmente naquela conservadora cidade. Todos marcaram encontro com as moças para o dia seguinte, já que teríamos que permanecer por lá para trabalhar num outro evento numa localidade próxima. Esta explicação se torna necessária porque nosso procedimento normal, na época, após os bailes fora de Beagá, era entrar na condução e voltar correndo pra casa. Fomos todos para a modesta pensão onde nossos contratantes nos alojaram, exceto dois dos integrantes da banda, que preferiram curtir o que restava da noite num bordel local. E era lá que morava o perigo…
Em quase todas as cidades do interior, a zona boêmia fica localizada nas beiradas dos rios e do lado oposto ao da igreja matriz, sei lá por que cargas d’água. Foi naquele amontoado de pequenos barracos que os dois integrantes da banda passaram aquela noite. No dia seguinte, bem cedo, fomos passear pela cidade, escoltados e ciceroneados pelas namoradas da véspera, inclusive as desacompanhadas eleitas dos nossos dois, digamos, transviados companheiros.
Foi uma obra do acaso e do azar. Pois não é que o motorista que nos conduzia achou por bem passar por uma estrada que passava bem ao lado do rio? Lá deparamo-nos com a cena inusitada. Bem em frente a um dos barracões, ao lado de duas bem nutridas mulatas, os dois componentes da banda, de cuecas, tomavam um gostoso e reconfortante banho de sol. E ainda acenaram para a turma, imaginem.
Naquele momento, como que por milagre, todas as nossas namoradas pediram para voltar pra casa e nenhuma delas prosseguiu no romance com qualquer um que fosse participante daquele pervertido conjunto. No trabalho seguinte e na viagem de volta, faltou pouco para os dois “vida-torta” não serem, a bem da comunidade e da banda, linchados.
muito bom seu site gostei muito do seu conteúdo.Vou passar mais vezes para ver as atualizações.abraço para vcs.